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Galeto |
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Duda com o Galeto |
A minha primeira ave pet que tive, segundo relatos da minha
mãe, foi um pombo desses de rua, que não sei por que a minha mãe catou em algum
lugar, quando eu tinha tipo 3 ou 4 anos de idade e o guardava em um carrinho de
feira, desses feito de arame. Segundo a dona Helena, eu tinha certo nervoso
daquele bicho alado que morava num carrinho de feira e achava que ele era algo
sujo (o que, de fato, não estava totalmente errado, mesmo com 3 ou 4 anos) e,
cada vez que o via, jogava um balde de água supostamente para lavá-lo. Resumo,
cada vez que o via, chuáááá, o pobre coitado levava um banho compulsório. Até
que a minha mãe deve ter se dado conta da insanidade que fez e resolveu soltar
em alguma praça pública de São Paulo. Talvez na mesma que ela catou. Isso
também deve ter a feito repensar na ideia de ter outro filho.
A segunda ave pet eu já devia ter uns 11 anos e, sempre que
ia para as aulas de japonês no centro, aos sábados, passava em frente a uma
daquelas lojas de ração, que serviram de rascunho para as pet shops atuais. E
via aquelas gaiolas horizontais lotadas de pintinhos. Juntei uns caraminguás
por muito tempo até ter o suficiente para comprar um desses pintinhos. Confesso
que não me lembro muito bem o que a minha mãe falou quando cheguei em casa com
uma pseudo galinha ou galo, pois quando há uma estridência na voz das pessoas
histéricas, meu cérebro simplesmente bloqueia o que é dito. Talvez porque meus
ouvidos não consigam ainda escutar sons que apenas os cães conseguem ouvir. E o
tal pintinho chamado de Tiquinho (puxa, que nome mais original...), morou lá em
casa por alguns meses e já começava a trocar a penugem por uma plumagem de
frango. E um belo dia (claro que não era um belo dia, foi um dia horrível) eu
pisei nele sem querer e agonizou por algum tempo até morrer. Fiquei arrasado.
Lembro até hoje que minha mãe me levou ao Shopping Rio Sul para me distrair um
pouco. Até entrar num fliperama (aos mais novos, Google it) que era algo
terminantemente proibido para mim ela deixou.
A terceira experiência foi a mais breve. Devia ter uns 14
anos e já tinha um gato alucinado em casa. Mas botei na cabeça que deveria ter
um periquito, pois um amigo do colégio tinha um tuim (parece um papagaio
miniatura, bem manso). Não me lembro de fazer uso de qualquer medicamento
lícito ou ilícito que pudesse me causar esse tipo de alucinação a ponto de
comprar um. Perto de onde eu morava, numa galeria tinha outra dessas lojas de
ração pré pet shop que sempre tinha um gaiolão cheio de aves diversas. E
resolvi novamente juntar uns trocos e mesadas para conseguir comprar um
periquito. Lembro perfeitamente o dono da loja, um senhor magro e alto (ok,
alto para mim não é um bom parâmetro) e que tinha um bigode parecido com o do
seu Madruga. Aliás, ele era um sósia perfeito do seu madruga, exceto que ele
não usava nenhum boné azul. E voltei para casa com um periquito desses verde e
amarelo (mas que também poderia ser um amarelo e azul claro) dentro de um
saquinho de papel pardo, desses de colocar pão, com uns buracos para que o
bicho pudesse respirar e a parte de cima torcida para fechar. Ao chegar em
casa, fui soltar e a surpresa! O bicho era bravo e saiu me bicando. E bicada
desse bicho dói! O bicho voando pela casa, o gato tentando pegar o periquito e
eu fugindo desse ser antissocial e agressivo até que ele entrou no banheiro e
eu fechei a porta. O gato tentando pegar o periquito e eu tentando fugir dele.
Só que ele entrou atrás do vaso sanitário, que normalmente tem um buraco e daí,
não conseguia mais pegá-lo. Não me lembro bem como minha mãe conseguiu pegar o
periquito, pois novamente ela emitia uns sons cuja frequência saía da faixa
auditiva humana. E no dia seguinte, ela foi devolver o bicho pra loja onde
havia comprado. Desde este dia, aves para mim era apenas comida.
E algumas décadas depois, chega em casa este serzinho
emplumado com um topete imponente que foi carinhosamente chamado de Galeto.
O mais interessante é que aparentemente ele me escolheu como
dono. Compramos uma gaiola grande, brinquedos, ração e mistura de sementes e
potes para água e a comida. Teoricamente, a Duda deveria ser a responsável por
ele, trocando água e comida e o jornal do fundo da gaiola todos os dias, mas
ela ainda é muito pequena e acabou sobrando para mim. Durante umas duas
semanas, ele estava lá feliz na gaiola, era tirado para brincar fora comigo e
com as crianças e eu achava que ele estava bem. Mas um dia, quase no fim do dia
a babá me liga desesperada dizendo que o “passarinho” da Duda tava mole e sem
se levantar. Voei para casa, e quando o peguei deitado na gaiola vi que ainda
estava vivo e voltei correndo para a clínica para ser atendido pelos
veterinários da Prosilvestres. Como havia o relato de que a Duda tinha passado
a tarde inteira brincando com ele e ele não comeu por isso, achava que poderia
ser uma hipoglicemia absurda e fiz a Duda ir comigo para ver o atendimento.
A primeira veterinária que o avaliou, a Dra. Loide, olhou
para o Galeto com olhos tristes, preocupados, quase desanimados e disse de
forma tão meiga: - PUTA QUE PARIU... E começou o tratamento. Soro, vitaminas,
glicose e antibióticos mil para que ele reagisse. Até que ele começou a dar
sinais de vida novamente. Tinha passado a primeira noite com o outro
veterinário, Dr. Rafael. Ele ainda está internado, mas apenas para ganhar peso
e terminar o ciclo de antibióticos. Quando ele chegou em casa pela primeira
vez, ele estava com 77 gramas. No dia da crise ele estava pesando 54 gramas!
Estava desnutrido e desidratado ao extremo. Hoje, ele já ganhou peso e está com
86 gramas, por alimentação forçada por sonda durante vários dias até ele voltar
a comer sozinho. O importante nessa confusão é que eu, num primeiro momento,
achava que a culpa era da Duda, mas na verdade, a culpa era minha, pois como
nunca tinha tido uma ave, não tinha ideia de como saber se ele estava se
alimentando ou não. Eu o via enfiando a cara no potinho com as sementes e rações
e achava que ele estava comendo e na verdade ele deve ter passado vários dias
sem se alimentar e, consequentemente sem beber água também. Quando me
informaram que o caso era decorrente de vários dias, pedi desculpas a Duda. A
culpa era toda minha pela minha ignorância com animais que não cães e gatos.
Ele já está na internação há mais de um mês e já próximo da
alta clínica. É um bicho fascinante. Desde antes de ficar doente, ele já
reconhecia a minha voz e ao ouvir ele começava a piar até que eu o pegasse. E
isso não mudou. Chego à clínica e lá de baixo ele fica piando até eu aparecer
para ficar com ele. E quando a Duda fica com ele, ele não sossega, fica
agitado, inquieto e deixa a pobre criança frustrada... Durante a internação, eu
ficava assobiando o hino do Palmeiras. E não é que hoje, quando eu o ignoro, ele
começa a ensaiar o hino? Ainda tá aprendendo, mas dá pra perceber a entonação diferente
para chamar a atenção.
Um dia desses, a Raphaela foi na internação pegá-lo para
ficar um pouco com ele e ele foi na boa. Até me ver. Assim que me viu, ficou se
jogando até vir pro meu ombro. Uma vez no meu ombro, a Raphaela o chamava pra
voltar pra ela e ele simplesmente virava a cara pra ela! E quando ela esticava
o dedo pra ele empoleirar, ele empurrava o dedo dela com o bico. Faz isso
porque sabe que a mulé é braba. Hoje, a Duda tentou ficar com ele, mas ele
sempre voltava para mim. A Duda tentava fazer carinho e ele bicava o dedo dela!
Até outras pessoas desconhecidas para ele que tentavam apenas fazer carinho
nele, ele bicava!
Embora algumas pessoas insistam em chamá-lo de galináceo
topetudo, Neymar e outras coisas, é um psitacídeo. E para lembrar é fácil: Ele
é um caloPSITAcídeo.
Nunca pensei que fosse ser tão querido por uma ave, que até
então era basicamente sinônimo de comida. Deu fome e acho que vou devorar um
galeto por aí. Um galeto, não o Galeto.