Sunday, January 30, 2011

Empregadas Domésticas Domesticadas

Nasci em São Paulo, de pai japonês mesmo e de mãe brasileira, paulistana, mas de pais japoneses e por isso, a primeira língua que aprendi foi o japonês, antes mesmo do português. E aprendi o português assistindo televisão, que na época ainda era preto e branco. Esta introdução aparentemente é totalmente fora de contexto, mas irão entender mais adiante.

A primeira empregada doméstica que trabalhou na minha casa, ainda em São Paulo, se chamava Nara. Só que "onará" em japonês significa flato. Peido. Pum. Ou seja, desde pequeno eu tinha crises de riso apenas por chamar a empregada pelo nome. Ficar o dia inteiro falando: - “ô, Naraaaaa!”, me rendia horas de riso que, aparentemente, esta doméstica não tinha a menor idéia do porquê. Era uma senhora meio gorda, pesada, que uma vez, ela foi subir num banquinho na área para pegar alguma coisa e, escorregou do banquinho e caiu em cima do tanque de lavar roupas, de granito áspero e quebrou o tanque! O mais impressionante é que ela não sofreu nada. E por pouco não caiu lá pro subsolo.

Depois dela, veio outra doméstica, carioca, de cabelos curtos chamada Janete, que foi citada no post anterior. E como disse no post anterior, eu a chamava de “lanchanete”. Era uma idiota completa. Além do ocorrido com a senhora idosa, que era minha babá, que desmaiou e ela simplesmente disse: -“ah, ela só desmaiou” e nada fez, lembro de uma noite que a cama dessas dobrável, com armação de metal com molas desmontou e ela caiu no chão. Isso porque ela dormia no mesmo quarto que eu, pois a casa era pequena e, durante a noite, ela funcionava como uma babá noturna. Ela também me levava eventualmente para a escola e, apesar de não entender corretamente o dialeto estranho que ela falava, a gente conversava muito. Obviamente, não me lembro de qualquer diálogo, mas lembro que ela falava as coisas começando em segunda pessoa e não concordava o verbo, como todo carioca. Ou seja, ela falava: - “tu vai pra escola...” e eu não entendia o “tu”. Tentava encaixar o “você” no lugar de “tu”, mas sabia que não era “você” que ela falava de forma alguma. Sendo paulistano, soava esquisito para mim. Minha mãe mandou ela embora depois que ela soube que a Janete não deixava eu assistir os programas que eu queria assistir, provavelmente “Vila Sésamo” com aquele pássaro azul (Garibaldo, acho – ok, a televisão era preto e branco, mas em revistas, via que era azul e na versão atual é amarelo) e a atriz Sônia Braga (ok, isso eu vi numa pesquisa rápida no Google), e outros programas como os Três Patetas (The Three Stooges - eu gostava da formação original, Moe, Larry e Curly. O Shemp é chatérrimo), um outro super herói esquisito chamado Esper (que não é o Ronaldo – é o Light Speed Esper) e Thunderbirds, um programa tipo Star Treks, só que de bonecos de marionetes muito bem feito pra época. Meu pai também trazia os brinquedos desses programas quando ia pro Japão, o que reforçou as minhas lembranças. Sim, a Janete me privava de assistir esses programas, pois ela queria assistir novelas ou outras coisas pouco interessantes para um moleque de poucos anos.

Deve ter tido outras domésticas na nossa casa até a gente se mudar para o Rio de Janeiro, mas não me lembro. E, desde que nos mudamos para cá, uma senhora negra, magra, de sorriso fácil chamada Josefa nos acompanhou durante décadas. Pelos meus cálculos imprecisos, deve ter trabalhado para minha mãe de 1978 até 2006, quando ela já não tinha mais saúde e minha mãe apenas pagava ela mesmo sem trabalhar por consideração. E, se não me falha a memória, ela faleceu pouco após o meu casamento ou após o nascimento da Eduarda. Como toda empregada doméstica, ela não fazia muita coisa, a não ser passar roupa. Ela tinha certa obsessão por passar roupas. A primeira coisa que fazia quando chegava à minha casa, por volta das seis da manhã, era passar roupas. Ficava horas passando roupas, alisando as roupas. Ela passava até meias, pano de chão, toalhas e outras coisas que normalmente ninguém passa. Mas limpar mesmo a casa, nada.

Depois que casei, a empregada que ia semanalmente era a D., que já era empregada da família da Raphaela há uns 20 anos. E, como ela é, na teoria, doméstica da minha sogra, a gente procurou várias domésticas e umas piores do que as outras.

Tinha uma, que era esposa do porteiro do prédio onde a gente morava, que trabalhava direitinho, não falava muito, mas eficiente. Durou pouco, pois ela não sabia lidar direito com bebês e, acho que com a vinda da Duda, ela se sentiu acuada, embora a gente nunca tenha feito ela tomar qualquer função de babá, não quis mais ficar.

Então, um dia, a Raphaela assistindo um desses "maravilhosos" programas vespertinos, soube da história de uma senhora que apareceu numa vinheta de alguma novela dizendo que, após ouvir uma música do Roberto Carlos, amanheceu “babada”. E, após a vinheta ir ao ar, ela foi demitida da casa onde trabalhava, por ser uma atitude incompatível e principalmente inconveniente para uma doméstica em uma casa com crianças.

A Raphaela, vendo o programa, resolveu ligar para a emissora e colocou o nosso telefone a disposição dela para entrar em contato conosco (dela leia-se, pois eu só fiquei sabendo quando já tinha ligado para a emissora). Ela começou a trabalhar na nossa casa e, acho que a fama momentânea dela subiu a cabeça. Era uma senhora já aposentada, mas exigiu da gente carteira assinada, mesmo a gente explicando que os benefícios recolhidos não iriam para ela, e sim para o governo. E aí, ela começou com um papo estranho de que a mãe dela era de sindicato de domésticas e outras coisas ameaçadoras. Após umas duas semanas, dispensamos. Durante o pouco tempo que ela trabalhou na nossa casa, ocorreu uma coisa que eu abomino. Eu tinha comprado um pote de Nutella. A Raphaela não gosta, logo, ela não come. A Duda tinha alguns meses e não seria capaz de pegar num armário alto. E num belo dia, quando abro o pote, vejo que alguém tinha comido parte e com garfo, pois tinha ranhuras de garfo em toda a superfície do chocolate. Eu mostrei para a Raphaela e perguntei se ela achava que eu deixaria a superfície daquele jeito e ela balançou negativamente a cabeça, me conhecendo e sabendo que nunca deixaria daquele jeito, e sim, liso como se fosse novo. Joguei fora o muito que ainda restava, com nojo.


Como a gente já recebia a visita esporádica de uma entidade que se diz faxineira, a D., e não tinha muitas outras opções, ela acabava vindo trabalhar na nossa casa. Eu tenho certeza de que ela é um ectoplasma perdida em algum lugar do limbo e não sei por que ela veio parar na família da Raphaela e assim ela acabou encarnando lá em casa. É uma criatura negra, forte, com feições assustadoras, e que tem uma capacidade incrível de fazer com que objetos da casa sumam e vão parar em lugares inimagináveis. Sabe aquela coisa meio Poltergeist, que num momento vê um remédio dentro da própria caixa, no criado mudo e, no momento seguinte, o mesmo remédio está fora da caixa e dentro do armário da cozinha, onde se guarda pratos? Ou, aquele engradado de leite longa vida que vem seis unidades, eu abro uma caixa e quando vou contar só tem quatro? O que me faz pensar até que eu não sei contar ou que tenho problemas graves com aritmética. Esta é a entidade D. Ela ainda vem aqui trabalhar, infelizmente. Como a Josefa que tinha uma obsessão por passar roupas, a obsessão da D. é lavar roupas na máquina de lavar. Ela deve ter orgasmos múltiplos vendo a máquina de lavar roupas funcionando. É impressionante. Se eu pego uma camiseta que apenas separo, não uso e coloco em cima da cama, em alguns segundos, ela aparece sendo chacoalhada com água e sabão em pó dentro da lavadora. Ela me vê pegando uma toalha limpa, nova e uso apenas uma vez, mas logo depois, já está a pobre toalha sendo lavada e outra toalha pendurada no cabide do banheiro.

Quando algo some da casa, e isso é uma coisa muito comum, no dia que ela vem trabalhar, é só ligar para ela que temos duas respostas distintas; uma é a famigerada e odiosa “não sei, não vi” e a outra é que ela consegue colocar coisas em lugares totalmente “nada a ver”. Com o tempo, a gente aprende a “pensar” como ela e procura nos lugares mais absurdos e lá está o controle remoto do DVD dentro da gaveta da pia do banheiro social. Ou o CD de instalação de algum hardware do meu PC dentro de um livro do Stephen King. Outras coisas se perdem para sempre e nem São Longuinho acha, mesmo dando três mil pulinhos.

As domésticas, de um modo geral, acham que não percebemos quando “some” um rolo de papel higiênico caro. Acham que nunca iremos sentir falta daquele único pote de iogurte que você está guardando para tomar ansiosamente no café da manhã. Ou que não reparo que a garrafa de refrigerante que tomei um copo está no fim. Eu sei quantas camisetas eu tenho e quais são as minhas favoritas, que aparentemente são as favoritas dos filhos ou maridos delas, assim como meias. Não me faça colocar números de série nas minhas roupas, para que assim eu saiba quais estão faltando e quais meias fazem pares. Não quero nem pensar sobre escova de dente.

Uma dica para as domésticas, não tentem “completar com água” a porção de shampoo que ela levou para casa em algum outro frasquinho. Que leve, mas não dilua a droga do meu shampoo. Quando eu comprei e eu abri pela primeira vez, eu gravei a consistência do produto e sei que não é tão higrófilo a ponto de transformar num líquido que escorre entre os meus dedos. Barras de chocolate não perdem uma fileira inteira por sublimação. Bebidas não evaporam com as tampas fechadas. Eu percebo quando um perfume que desapareceu por uma semana reaparece misteriosamente no mesmo lugar que procurei inúmeras vezes e com seu conteúdo bem abaixo da última vez que eu usei. Se quiserem ou precisar de algum item que eu comprei, peça. Pode ser que eu dê sem o menor problema. Levar sem o meu consentimento se chama furto. Fica a dica.

1 comment:

  1. A Laura pegou a nossa empregada (ex) usando uma legging dela (da Laura) na semana passada. A desculpa? Ah, dona Laura, meus uniformes (SETE!) estão sujos...

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